quarta-feira, 30 de março de 2011

Data incômoda para a direita


por: Emir Sader


A cada ano, quando nos aproximamos da data do golpe de 1964, uma sensação incômoda se apossa da direita – dos partidos, políticos e dos seus meios de comunicação. O que fazer? Que atitude tomar? Fingir que não acontece nada, abordar de maneira “objetiva”, como se eles não tivessem estado comprometidos com a brutal ruptura da democracia no momento mais negativo da história brasileira ou abordar como se tivessem sido vítimas do regime que ajudaram a criar? Difícil e incômoda a situação, porque a imprensa participou ativamente, como militância politica, da preparação do golpe, ajudando a criar um falso clima tanto de que o Brasil estivesse sob risco iminente de uma ruptura da democracia por parte da esquerda, como do falso isolamento do governo Jango. Pregaram o golpe, mobilizaram para as Marchas da Família, com Deus, pela Liberdade, convocadas pela Igreja, tentaram passar a ideia de que se tratava de um movimento democrático contra riscos de ditadura e promoveram a maior ruptura da democracia que o Brasil conheceu e a chegada ao poder da pior ditadura que conhecemos. Na guerra fria, a imprensa brasileira esteve plenamente alinhada com a politica norteamericana da luta contra a “subversão” contra o “comunismo”, isto é, com o radicalismo de direita, com as posições obscurantistas e contrárias à democracia, estabelecida com grande esforço no Brasil. Estiveram em todas as tentativas de golpe contra Getúlio e contra JK. Em suma, a posição golpista da imprensa brasileira em 1964 não foi um erro ocasional, um acidente de percurso, mas a decorrência natural do alinhamento na guerra fria com as forças pró-EUA e que se opuseram com todo empenho ao processo de democratização que o Brasil viveu na década de 1950. Deve prevalecer um misto de atitude envergonhada de não dar muito destaque ao tema, com matérias que pretendam renovar a ideia equivocada de que a imprensa foi vitima da ditadura – quando foi algoz, aliado, fator no desencadeamento do golpe e da ditadura. (O livro de Beatriz Kushnir, Cães de guarda, da Boitempo, continua a ser leitura indispensável para uma visão real do papel da mídia no golpe e na ditadura.) Promoveu o golpe, saudou a instalação da ditadura e a ruptura da democracia, tratou de acobertar isso como se tivesse sido um movimento democrático, encobriu a repressão fazendo circular as versões falsas da ditadura, elogiou os ditadores, escondeu a resistência democrática, classificou as ações desta resistência como terroristas – em suma, foi instrumento do regime de terror contra a democracia. Por isso a data é incômoda para a direita, mas especialmente para a imprensa, que quer passar por arauto da democracia, por ombudsman das liberdades politicas. Quem são os Mesquitas, os Frias, os Marinhos, os Civitas, para falar em nome da democracia? Por isso escondem, envergonhados, seu passado, buscam a falta de memória do povo, para que não saibam seu papel a favor da ditadura e contra a democracia, no momento mais importante da história brasileira. Por isso tem que ressoar sempre nos ouvidos de todos a pergunta: Onde você estava no golpe de 1964? Emir Sader, sociólogo e cientista, mestre em filosofia política e doutor em ciência política pela USP – Universidade de São Paulo.

quinta-feira, 24 de março de 2011

Educação não é negócio nem espaço de repressão



O atual processo de negociação entre professores e donos de escolas particulares tem deixado expostas mais que divergências entre percentuais de reajustes e benefícios: demonstra a profunda diferença de concepção sobre educação e relações de trabalho entre aqueles que praticam a educação e os que lucram com ela.

Segundo orientação às direções de escolas em nota publicada pelo Sinep/MG, no dia 21/3, na véspera da assembléia geral da categoria, sob o título O negócio é a negação do ócio, o patronal volta a atacar o movimento dos professores, sintomaticamente usando uma frase ícone do nazismo: “Uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade”. É este o caminho apresentado pelos donos de escolas, diante de um processo reivindicatório justo e democrático.

O documento desqualifica a greve e tenta relacioná-la ao ócio. Chega ao absurdo de recomendar às escolas que impeçam a entrada de diretores do sindicato e termina com uma ameaça velada, dizendo que a paralisação poderá prejudicar “até o professor”.

O texto, além de desrespeitar os professores e afrontar o direito constitucional de organização e manifestação dos trabalhadores, estimula a já frequente prática de assédio moral e pressão nas escolas. Deve ser condenado, portanto, por todos aqueles preocupados com a manutenção de um ambiente escolar saudável, voltado para a qualidade do ensino.

É bom ressaltar que se enganam aqueles que pensam que uma greve é um instante de descanso e lazer. Ao contrário, é um momento de exercício de cidadania e de trabalho, para si e para a categoria, e o instrumento legítimo de mobilização diante deste cenário de impasse nas negociações.

Além disso, os números oficiais da economia colocam em suspeição o aludido risco de insolvência das escolas. Em 2010, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro cresceu 7,5%, o maior percentual em mais de 20 anos. De acordo com projeções do governo, neste ano a expansão deve ser de cerca de 5%.

No ano passado, a economia brasileira gerou 2,55 milhões de postos de trabalho, um recorde no país, e, de acordo com o IBGE, o rendimento do trabalhador atingiu o seu maior patamar nos últimos sete anos. O valor de R$ 1.490,61, média calculada para 2010, representa um ganho de 3,8% em relação a 2009 e de 19% desde 2003.

Conforme divulgado nesta quarta-feira (23/3), em jornal de circulação nacional, o Ministério do Trabalho informou que foram criados 448 mil empregos formais no primeiro bimestre deste ano, um recorde para o período. A taxa de desemprego medida pelo IBGE nas seis principais regiões metropolitanas se aproxima de 6%, a menor da série histórica. Além disso, há uma aceleração dos ganhos salariais acima da inflação.

Dados do Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos) mostram que 89% das 700 negociações salariais conduzidas em 2010 conseguiram reajustes acima do INPC.

São indicadores que ilustram com clareza o fato de que a economia brasileira vive um momento extremamente favorável, com crescimento das atividades econômicas e da massa salarial da população. Tanto é que, para acompanhar esse ritmo, as mensalidades escolares foram reajustadas, de um modo geral, em índices bem superiores ao da inflação, e as instituições de ensino anunciam, com frequência, expansão dos “negócios”.

Ao contrário da imagem vazia que o patronal faz do setor público, o Sinpro Minas entende que a educação ofertada pelo Estado apresenta características que deveriam servir de paradigma ao setor privado, como a liberdade de organização, a estabilidade no emprego, os investimentos em pesquisa e extensão e em salários, no caso do ensino superior, entre outras.

Também não é verdade, como tenta fazer crer a nota, que os salários dos professores da rede privada situam-se “num patamar alcançado só por algumas poucas categorias profissionais”. A categoria vem sofrendo, há anos, a desvalorização salarial, a intensificação das atividades e a precarização das condições de trabalho.

Segundo estudo feito com base em dados do IBGE, o salário médio de um professor da educação básica é 40% menor que a remuneração de um trabalhador com o mesmo nível de ensino. Portanto, conceder reajuste de apenas 6,53% (INPC) para quem ganha acima do piso, e de 7,5% para quem o recebe, como prevê a proposta patronal, é ignorar a realidade socioeconômica brasileira e não valorizar a categoria.

Se o Sinep/MG acredita mesmo que os docentes são o principal agente da educação, como afirmou em nota, não há motivos para deixar de atender as reivindicações apresentadas (12% de reajuste salarial, equiparação dos pisos da educação infantil, regulamentação da educação a distância, entre outras) que resultam em valorização profissional e melhoria da qualidade de ensino. Não atendê-las é no mínimo contraditório.

Dessa forma, o Sinpro Minas lamenta e repudia a forma autoritária como o patronal vem tratando o movimento grevista. Propor “conter toda tentativa de paralisação”, como faz a nota, é sufocar o diálogo e estabelecer como prioridade a mercantilização da educação, em detrimento da democracia nas instituições de ensino e da qualidade do ensino. Paz sem voz não é paz, é medo!

Portanto, para o bem dos alunos, dos pais e, principalmente, dos professores, o Sinpro Minas conclama a todos que apoiem a greve da categoria, para que possamos pressionar os donos de escolas e negociar um acordo pautado no respeito e na valorização do profissional da educação, tão necessário ao futuro do Brasil.


Sindicato dos Professores do Estado de Minas Gerais (Sinpro Minas)


quarta-feira, 23 de março de 2011

Estudo indica que religião pode acabar em nove países ricos




Dados de censos colhidos desde o século 19 indicam que a religião pode ser extinta em nove nações ricas que foram analisadas em um estudo científico.

A pesquisa identificou uma tendência de aumento no número de pessoas que afirmam não ter religião na Austrália, Áustria, Canadá, Finlândia, Irlanda, Holanda, Nova Zelândia, Suíça e República Tcheca --o país com o índice mais elevado, com 60%, fez parte do chamado mundo socialista após a Segunda Guerra.

Usando um modelo de progressão matemática, o levantamento --divulgado durante um encontro da American Physical Society-- mostra que as pessoas que seguem alguma religião vão praticamente deixar de existir nestes países.

Na Holanda, por exemplo, 70% dos holandeses não terão religião alguma até 2050. Hoje, esse grupo já é de 40% da população.

Tendência progressista

"Em muitas democracias seculares modernas [na medida em que o progresso avanço], há uma tendência maior de as pessoas se identificarem como sem uma religião", afirma Richard Wiener, que trabalha em um centro de pesquisa em ciência avançada, subordinado ao departamento de física da Universidade do Arizona.

A pesquisa seguiu um modelo de dinâmica não-linear que leva em conta fatores sociais e a influência que exercem em uma pessoa a fazer parte de um grupo não-religioso. Os parâmetros se mostraram semelhantes em vários países pesquisados, indicando que a religião está a caminho da extinção nessas nações.

Consciência mais avançada

A rejeição à religião é um sinal de avanço da consciência humana e superação do obscurantismo na percepção da realidade. Ao longo da história, os preconceitos religiosos se chocaram de forma muitas vezes violenta contra o avanço da ciência.

A inquisição católica, na chamada Idade Média, foi uma prova grotesca da incompatibilidade entre religião e ciência, com gênios do pensamento como o filósofo Giodarno Bruno sendo queimados por defenderem ideias científicas ou perseguidos e forçados a uma falsa retratação, como foi o caso de Galileu Galilei, cujo drama foi objeto de uma bela peça teatral de Bertolt Brecht.

Obscurantismo reacionário

No dia 17 de fevereiro de 1600, Giordano Bruno foi queimado vivo no Campo dei Fiori, em Roma, sob acusação de heresia e blasfêmia. Ele sustentava que a Terra girava em torno de Sol, como de fato ocorre, mas a observação científica contrariava os dogmas reacionários da Igreja Católica,que concebia a Terra como o centro do universo.

Ao contrário de Galileu Galilei (1564–1642), Bruno se negou a mudar de opinião. Além disso, por ser padre e teólogo, suas heresias e dúvidas em relação à Santíssima Trindade, por exemplo, partiam de dentro da Igreja e foram interpretadas como um ato de insubordinação ao papa.

Já o físico, matemático e astrônomo Galileu Galilei (1564-1642) preferiu ensaiar uma falsa retratação, fingindo acreditar que a Terra era o centro do universo, conforme acreditava o papa, para não ser queimado vivo. Sobreviveu e deu continuidade, secretamente, às suas pesquisas científicas, na contramão dos dogmas religiosos e do obscurantismo da Inquisição, conforme a bela peça de Brecht (Galileu Galilei).

Com agências

segunda-feira, 21 de março de 2011

Agressão imperialista contra a Líbia: geopolítica e desforra




Mais uma vez o imperialismo usa a desculpa esfarrapada de “defender populações civis” para impor, pela força, a um país soberano, seus interesses e objetivos geopolíticos. Desta vez, o alvo do mesmo perverso roteiro, já encenado no Iraque, no Afeganistão, na Sérvia, é a Líbia.

A ação, contrariamente ao ocorrido no Iraque em 2003, tem um frágil biombo para disfarçar a agressão. Ele é constituído pela resolução do Conselho de Segurança da ONU que aprovou, por 10 votos contra cinco abstenções, as medidas agressivas contra Tripoli. O imperialismo não conseguiu sequer unir todo seu campo; entre os cinco países que não aceitaram acompanhar aquela medida, um deles é justamente a Alemanha, uma das principais potências imperialistas. Os outros quatro são, significativamente, os países que formam o Bric (Brasil, Rússia, Índia e China), o bloco cuja emergência marca o cenário recente no mundo.

As ações iniciadas contra a Líbia, sob comando dos EUA e reunindo forças militares de um conjunto de países europeus, destacando-se entre eles a França e a Inglaterra (além de Espanha, Itália, Noruega e Dinamarca), constituem mais uma grave violação da soberania de uma nação independente.

Desde o início, os protestos na Líbia tiveram uma característica distinta dentro da onda libertária que sacode o mundo árabe. Nos demais países, todos os sinais indicam movimentos democráticos que surgiram de maneira espontânea, manifestando o descontentamento das multidões e o repúdio contra regimes notoriamente aliados dos países imperialistas. Isso ocorreu na Tunísia, no Egito, e está em curso em outras nações, particularmente no Iêmen e no Barein. Nestes dois países, a repressão contra os manifestantes é sangrenta e mortal, deixando um rastro de cadáveres em sua passagem mas que, nem por isso, desperta nas potências o alegado sentido humanitário que proclamam contra Muamar Kadafi, evidenciando a hipocrisia das motivações que levaram à adoção da resolução agressiva do Conselho de Segurança da ONU.

Na Líbia, os protestos foram usados pelo imperialismo como uma oportunidade para a intromissão, usando como instrumento seus notórios aliados que fazem parte da chamada Frente Nacional pela Salvação da Líbia (criada e financiada pela CIA) e da monarquista União Constitucional Líbia, também apoiada pelo governo dos EUA.

Desde o início dos protestos contra Kadafi, em 20 de fevereiro, multiplicam-se os sinais de envolvimento das potências imperialistas no apoio a estas facções rebeldes, que logo constituíram um autodenominado Conselho Nacional Líbio; há notícias inclusive de que contrabandearam armas para eles. E a imprensa ligada ao imperialismo cumpriu o seu papel difundindo, pelo mundo, todo tipo de desinformação a respeito dos acontecimentos na Líbia, num nítido esforço para obter o apoio da opinião pública a favor da agressão contra o país.

Tudo isso já foi visto no passado recente, e pretende justificar este outro perigoso passo na escalada guerreira do imperialismo contra os povos.

Os ataques contra a Líbia, iniciados no sábado, envolveram mais de 19 aviões só dos EUA e 110 mísseis disparados de navios de guerra, danificando a infraestrutura do país, atingindo inclusive um hospital cardiológico, e deixando 64 civis mortos pelo menos na capital, Trípoli.

Os líbios resistem e há informações de que o governo começou a distribuir armas para um milhão de cidadãos, número que desmente a perda de apoio de Kadafi entre a população, que se mobiliza em defesa da unidade e da soberania do país.

A agressão imperialista contra a Líbia é mais uma aventura ofensiva de resultado imprevisível e demonstra, mais uma vez, a disposição do imperialismo de usar apenas a agressão e a força militar para impor suas próprias soluções aos conflitos internacionais.

A resistência pode ser tão determinada quanto a que ocorre nos outros cenários de guerra no Oriente Médio. Um dos objetivos do imperialismo é reforçar sua posição num quadro que está instável desde o inicio dos protestos árabes, no começo do ano. Além de controlar o petróleo líbio, o imperialismo busca uma posição de força na vizinhança de um Egito que pode deixar de ser um aliado incondicional e criar uma situação nova e desfavorável a seus interesses no norte da África. E pode haver também a vontade de desforra contra Kadafi que, durante décadas, foi um forte adversário de seus objetivos e domínio.

terça-feira, 15 de março de 2011

Esclarecimento à sociedade - GREVE dos Professores



O Sinpro Minas tomou conhecimento de uma nota divulgada pelo Sinep/MG, na qual a entidade patronal expõe falsos argumentos e comete deliberados erros, com a clara intenção de confundir a sociedade e desmobilizar a categoria, e orienta as escolas a não pararem no dia 16 de março (quarta-feira).

Em primeiro lugar, é preciso ressaltar que a paralisação das atividades é um direito legítimo dos trabalhadores, assegurado pela legislação trabalhista diante de impasses nas negociações. Assim, os professores, ao decidirem pela paralisação, de maneira autônoma, em hipótese alguma estariam praticando um comportamento “indesejável e aético” e “fugindo desastrosamente do seu papel de educador”, conforme afirmou o patronal.

Será que lutar por melhores condições de trabalho e vida é ser aético? Será que se acomodar, não tomar nenhuma atitude é a melhor maneira de ensinarmos aos nossos alunos o que é ser ético ou como exercer a cidadania de que tanto falamos em sala de aula e as escolas supostamente defendem? Afinal, quem está comprometendo o processo educativo: os professores ou os empresários que estão fazendo da educação uma mercadoria? Na verdade, quem impede os docentes, em muitas ocasiões, de exercerem com mais autonomia o papel de educador são as precárias condições de trabalho impostas pelos donos de escolas.

O Sinep/MG também duvida da sobrecarga de trabalho da categoria e diz que, para isso, é garantido o pagamento de 20% de adicional extraclasse (direito conquistado na Justiça no final de 1980). Na nota, o patronal afirma ainda que o Sinpro Minas se engana ao dizer que os professores, além de enfrentarem problemas de saúde e de violência no ambiente escolar, estão assumindo novas funções.

Deve ser pelo fato de não estarem em sala de aula e não assumirem os compromissos da carreira docente que os donos de escolas desconhecem a realidade da profissão e questionam a sobrecarga de trabalho.

Com o aparato tecnológico atual e as demandas da sociedade contemporânea, as atividades dos docentes aumentaram significativamente, consumindo, inclusive, finais de semana. Correção e elaboração de provas, atividades extraclasse e para a internet, preparação de aulas, material de recuperação, relatórios, lançamento de notas no diário virtual, enfim, uma quantidade de tarefas (muitas delas, inclusive, tradicionalmente eram realizadas pelos auxiliares de administração escolar) que se avolumou substancialmente nos últimos anos, mas o patronal se recusa a reconhecer e a valorizar. Tal realidade nos leva a perguntar se já não é o momento de o adicional extraclasse passar para 40% ou mais.

A respeito da violência nas instituições de ensino, fato mencionado na nota do patronal, vale lembrar que os próprios representantes de escolas reconheceram a existência do problema (o caso mais grave resultou na morte de um professor em dezembro do ano passado), conforme resultado de enquete divulgado pelo Ministério Público do Trabalho (MPT). Portanto, o que o Sinpro Minas quer, ao iniciar a campanha em torno do tema, é que as escolas assumam suas responsabilidades e tomem medidas efetivas para combatê-la, ao invés de ficarem apenas no plano do discurso, como tem ocorrido até o momento.

O patronal falta com a verdade ao dizer que, desde as primeiras reuniões de negociação, não cogitou retirar direitos da categoria. No dia 18 de janeiro, a comissão de negociação do Sinep/MG apresentou, por escrito e assinada, uma contraproposta que previa a retirada de conquistas, alterando mais de 15 itens da Convenção Coletiva de Trabalho (CCT), como o adicional extraclasse, bolsas de estudo, férias coletivas, recesso escolar e representação sindical.

Somente após a firme posição da diretoria do Sinpro Minas durante as negociações é que os donos de escolas recuaram e desistiram dessa contraproposta. Mas, nas reuniões seguintes, a lógica foi, de fato, de só negociar avanços em troca da retirada de conquistas.

Conceder apenas um reajuste pelo INPC (6,53%) para quem ganha acima do piso, e de 7,5% para os que o recebem – como querem os donos de escolas –, é ignorar a atual realidade socioeconômica brasileira e não valorizar a categoria. Em 2010, o Produto Interno Bruto cresceu 7,5%, o maior percentual em mais de duas décadas, e a economia gerou 2,55 milhões de postos de trabalho, outro recorde. A previsão oficial para este ano é de continuidade da expansão, com crescimento em torno de 5%. Portanto, não há razões, sobretudo de ordem econômica, para que as reivindicações não sejam atendidas.

Se o patronal realmente quer valorizar a categoria, por que não equipara o piso da educação infantil (de 0 a 3 anos) ao do ensino fundamental e concede ganho real de 12%, já que as condições econômicas são favoráveis? E por que não regulamenta a educação a distância?

Ao contrário do que a nota divulgada tenta fazer crer, boa vontade, transparência, compromisso com a verdade e transigência não têm sido práticas comuns do Sinep/MG, o que nos leva à conclusão de que quem recorre a evasivas é o patronal, como estratégia para não assumir publicamente sua intenção – isto é, aumentar ainda mais a sua já elevada margem de lucro, num processo de mercantilização da educação.

Por repudiar essa postura do Sinep/MG, pelo comprometimento com os fatos e por entender que a luta dos professores deve ser também assumida por todos aqueles compromissados com a qualidade da educação, o Sinpro Minas reafirma a paralisação das atividades nos três turnos no dia 16 de março (quarta-feira) com realização de assembleia.

Deseja, ainda, contar com a compreensão e o apoio de toda a sociedade e reitera que as reivindicações da categoria vão ao encontro de uma educação de qualidade, com professores valorizados e alunos bem preparados.

ASSEMBLEIA COM PARALISAÇÃO DAS ATIVIDADES

DIA 16/3 - QUARTA-FEIRA - ÀS 9 HORAS

LOCAL: HOTEL BRISTOL MERIT - (Rua Tamóios, 341 – Centro – BH)

sábado, 12 de março de 2011

A centralidade do trabalho



Escrito por Emir Sader - fonte vermelho

Durante muito tempo as análises críticas do capitalismo promoveram as relações de trabalho a tema central, a partir das próprias análises de Marx, que definem como centrais as relações capital-trabalho nesse tipo de sociedade. Se deduziam, no campo político, consequências que reduziam praticamente as contradições sociais a essas relações que, uma vez superadas, levariam à emancipação de toda a humanidade.

Temas como os de gênero, de etnias, de meio ambiente, seriam resolvidos pela superação da contradição capital-trabalho. Mais além de saber se os países que se assumiram como socialistas ao longo do século XX aboliram essa contradição central (avançaram nessa direção, mas estatizaram os meios de produção ao invés de socializá-los, abolindo ou quase, a propriedade dos meios de produção, mas transferindo-a para uma burocracia estatal e não para os trabalhadores), nessas sociedades aquelas contradições, apontadas como secundárias, sobreviveram fortemente.

Com as grandes transformações operadas no mundo a partir dos anos 80, o mundo do trabalho passou por um processo de total reversão dessa centralidade, seja pela incorporação positiva de outras contradições – como as apontadas, de gênero, de etnia, de meio ambiente -, mas também como uma enorme desqualificação das atividades ligadas ao trabalho.

Como ressaca daquela centralidade excludente do período anterior, se passou ao seu oposto.

O tema, que era um dos mais abordados na vida acadêmica nas décadas anteriores, passou a ser um entre outros, com interesse claramente declinante. A mídia passou a inviabilizar totalmente as relações de trabalho – tanto o noticiário, quanto a ficção, como as telenovelas, em que o mundo do trabalho praticamente não existe, apenas marginalmente.

Como interessa às elites dominantes ter as centrais sindicais e os sindicatos em situação de marginalidade de fraqueza, esse objetivo foi levado adiante com afinco. Criaram um mundo em que aparentemente ninguém mais trabalha, quando é o contrário o que ocorre: nunca tantos viveram do seu próprio trabalho. Acontece que as duríssimas políticas neoliberais incentivaram o trabalho precário, promovendo a fragmentação da classe trabalhadora. Nunca se trabalhou tanto, nunca tantos trabalharam tanto, mas em condições heterogêneas, com alto desemprego e subemprego, sem carteira de trabalho, sem poder apelar à lei e à organização sindical.

Mas a grande maioria da humanidade vive do trabalho e para o trabalho. Dedica todo o seu dia a isso, desde que se desperta, passando pelo duro transporte até o local de trabalho, por jornadas pesadas, pelo retorno à casa, processo que no seu conjunto abarca praticamente 2/3 do dia, para descansar, repor minimamente as energias e retornar no dia seguinte.

O trabalho continua sendo a atividade que, de longe, mais ocupa a grande maioria da humanidade. Uma atividade precária, mal remunerada, alienada -em que os trabalhadores, que produzem as riquezas, não decidem o que produzem, para quem produzem, a que preço, etc. -, que é o cotidiano de bilhões de pessoas em todo o mundo.

Desconhecer essa realidade ou subestimá-la, é se situar fora do mundo real das pessoas. Não por acaso as políticas que mais distribuem renda – confirmado pelo processo brasileiro – tem a ver com aumentos de salários, em particular do salário mínimo, de tal forma as atividades de trabalho são centrais para a sobrevivência das pessoas.

Se as atividades humanas não podem ser reduzidas às do trabalho, a realidade é que elas cruzam a vida de praticamente todos: negros, índios, mulheres, idosos, crianças (infelizmente) trabalham. Os empresários, por sua vez, vivem do trabalho alheio.

Por isso as atividades do mundo do trabalho e tudo o que as envolve tem que voltar a ser preocupações centrais dos governos democráticos, dos movimentos populares, do pensamento crítico e de todos os que lutam pela emancipação humana, conscientes que as relações continuam a ocupar lugar central no capitalismo – seus economistas não subestimam isso – e tem que ser contempladas centralmente na construção de um Brasil justo e solidário.

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Emir Sader é sociólogo. Texto retirado de seu blog.

quinta-feira, 3 de março de 2011

Imperialismo prepara carnificina na Líbia



Por: Jose Reinaldo - Vermelho

Os povos da Tunísia e do Egito derrubaram duas cruéis ditaduras apoiadas política, econômica e militarmente pelas potências imperialistas dos EUA e da União Europeia. Fizeram-no através de movimentos insurrecionais maciços, com marcada tendência revolucionária democrática e anti-imperialista. Na Líbia, o anseio por democracia está sendo atropelado pela guerra civil e a ameaça de agressão externa.

A experiência foi pedagógica e logo a oposição aos regimes retrógrados, contida a ferro e fogo durante décadas, se alastrou por todo o Magreb e Mashrek. Palavras como dignidade, liberdade, democracia, justiça social, independência nacional, soberania popular, morte aos tiranos, passaram a ser gritadas e cantadas como salmos no belo e sonoro idioma árabe. Uma jornada revolucionária que marca uma época, faz história e certamente muda qualitativamente o destino de milhões de pessoas.

Os meios de comunicação ligados às potências imperialistas fazem grande alarde sobre a rebelião árabe, aparentemente a apoiam, mas, na prática, ao evidenciar o supérfluo e esconder o essencial, aplicam a velha tática do Leopardo, de mudar algo para que tudo fique na mesma. Atraem a atenção do público para o pitoresco e, no máximo, para manobras políticas no quadro da criação de um regime liberal-burguês.

Certamente, as palavras gritadas pelos manifestantes e insurretos em todo o norte da África e no Oriente Médio não têm o mesmo significado quando interpretadas pelas forças revolucionárias e progressistas, que apoiam a emancipação dos povos, e os imperialistas, que visam perpetuar o jugo.

"Novo Oriente Médio"

Por isso, nesta hora todo cuidado é pouco com o emprego de conceitos e expressões. Não é de hoje que o imperialismo estadunidense introduziu na cena política a luta pela "reestruturação" e a "democratização" da região, das quais surgiria o "novo Oriente Médio". Ninguém menos do que George W. Bush transformou essa meta no mantra dos seus dois mandatos. Há dez anos o mais facínora de todos os mandatários do mundo moderno iniciou, pelos meios mais bárbaros, o combate pela "democratização do Oriente Médio", fazendo uma guerra de terra arrasada no Afeganistão.

Menos de dois anos depois, atacou o Iraque, de onde as tropas norte-americanas ainda não se retiraram. Massacraram o povo e cometeram magnicídio. Em 2006, quando o Líbano ardia em chamas, sob os bombardeios da aviação dos sionistas, bandidos financiados e armados pela Casa Branca e o Pentágono, a então secretária de Estado de Bush, Condoleezza Rice, disse que das cinzas nasceria o novo (sic!) Oriente Médio.

Na época, os falcões de Washington não podiam imaginar que a onda de rebeliões poria em xeque as repúblicas ditatoriais e as monarquias retrógradas dos seus acólitos: Tunísia, Egito, Arábia Saudita, Barein, Jordânia, Marrocos, Iêmen et caterva. O objetivo eram os Estados inquinados como "bandidos" : Irã e Síria. Quando se referiam a outras regiões, esses alvos eram acrescidos pela Coreia do Norte, na Ásia, e por Cuba e Venezuela na América Latina.

Para não perder o controle

Bush não está mais à frente da Casa Branca, mas essencialmente a política militarista não mudou, embora muitos se iludam, como o professor José Luís Fiori. Em artigo recentemente publicado, defende que “o projeto do presidente dos Estados Unidos pode revolucionar a geopolítica mundial”.

Os Estados Unidos e demais potências imperialistas não mudam na essência, mas fazem seu jogo tático. Procuram adaptar-se à nova situação. Se a rebelião e a insurreição das massas são inevitáveis, se os tronos balançam e as cabeças coroadas periclitam, os Estados Unidos e seus aliados buscam diferentes formas de transição, experimentando juntas militares pacificadoras, novas constituições e toda a sorte de arranjos liberais, com o objetivo de que a situação não escape do seu controle.

É nessa perspectiva que se deve analisar os acontecimentos na Líbia. Tal como nos demais países, a Líbia também viveu um breve momento de ebulição democrática. Mas, diferentemente de todos os demais países em que estão em curso rebeliões, os acontecimentos subsequentes mostraram que não era de manifestações democráticas nem de uma insurreição popular que se tratava.

As manifestações foram a gota d´água para o início de uma guerra civil e a montagem de pretextos para a intervenção militar estrangeira. O noticiário dos últimos dias está repleto de fatos comprovadores de que muito ao contrário de uma revolução popular, está em curso na Líbia uma operação pré-ordenada, em que se mancomunaram interesses internos com externos.

Kadafi, antigo líder de uma revolução anticolonial, está sendo demonizado. Durante três décadas ele se compôs com forças progressistas e anti-imperialistas no mundo. Ultimamente, fez alianças espúrias com o imperialismo mas não se converteu, como em seu tempo Sadat e depois Mubarak, em fantoche. Não exercendo qualquer controle sobre a Líbia de Kadafi, diante do menor sinal de instabilidade política, os EUA e as potências europeias se movimentam pressurosamente para se apoderar do país e de suas riquezas energéticas.

Pretextos de todo o tipo

A democracia na Líbia é questão urgente a resolver. Mas não virá pelos tanques e porta-aviões dos EUA e da Otan. A luta democrática é indissociável da soberania nacional e da soberania popular. A agressão armada viola os princípios da Carta das Nações Unidas.

Em nome do interesse das grandes potências de açambarcar o petróleo da Líbia, estão sendo invocados pretextos de todo tipo: milhares de mortos, uma centena e meia de milhar de refugiados, proteção a estrangeiros residentes no país, crise humanitária. Nenhum desses pretextos se sustenta. Os mortos e refugiados resultam da guerra civil. O exército se dividiu, uma parte aderiu à oposição. Os dois lados disparam, ferem, matam, provocam êxodo. Quanto aos estrangeiros residentes no país, não se registra qualquer ocorrência. Somente a China repatriou em poucos dias 30 mil trabalhadores sem incidentes.

Nada justifica a intervenção armada dos Estados Unidos e da Otan. A ONU não deve autorizá-la, sob pena de ser responsabilizada por mais uma carnificina. O sistema multilateral, ainda que precário, tem mecanismos que podem ser acionados para ajudar na estabilização da Líbia. A humanidade deve estar vigilante e solidária com os povos da Líbia, de todo o norte da África e do Oriente Médio, na luta pela democracia e em defesa de sua soberania. Os movimentos de solidariedade e os governos democráticos e progressistas não devem permitir que se repita a agonia de um país sob o tacão da Otan, como ocorreu há mais de uma década na ex-Iugoslávia.

*Editor do Vermelho

terça-feira, 1 de março de 2011

CMS abre guerra contra “agenda regressiva"



Reproduzo artigo de Leonardo Wexell Severo.
Publicado no sítio da CUT.

A plenária nacional da Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS) elevou o tom contra a “agenda regressiva” imposta pelos interesses do sistema financeiro e sua mídia, decidindo pela realização de uma jornada unificada de lutas, ampla e massiva - já no primeiro semestre - por mudanças na política econômica e pela democratização do Estado.

As entidades populares defenderam a implantação de reformas estruturais - como a agrária, urbana, educacional e política -, e a construção de um novo marco regulatório das comunicações para pôr fim ao oligopólio privado e garantir a mais plena liberdade de expressão.

Com a presença de 80 dirigentes de entidades sindicais, de trabalhadores rurais e urbanos, estudantis, comunitárias, femininas e da negritude, representando 11 estados (AP, BA, ES, MG, MT, PR, RJ, RO, RS, SC, SP) e do Distrito Federal, a plenária realizada nesta sexta-feira (25) na sede central da Apeoesp, na capital paulista, debateu a conjuntura nacional e internacional, apontando formas unitárias de atuação no próximo período “para impedir o retrocesso”.

Conforme o documento aprovado pela plenária da CMS, embora a eleição da presidenta Dilma esteja ligada “à determinação do povo por mais mudanças, pela afirmação da soberania nacional e o aprofundamento da democracia”, “existe forte pressão dos setores conservadores e sua mídia para impor uma agenda regressiva ao próximo período”.

“As ações implantadas nesse início de mandato pela equipe econômica - sob justificativas do controle da inflação e das contas públicas – seguem num caminho diferente do apontado pelas urnas e reproduzem a pauta imposta pelos interesses do setor financeiro, sustentadas no Banco Central”. Exemplo disso, aponta a CMS, “é o aumento dos juros, o congelamento das contratações públicas, o contingenciamento de 50 bilhões de reais e o pouco diálogo no debate sobre o reajuste do salário mínimo”.

Abertura

Presente à mesa de abertura, o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Artur Henrique, lembrou que o aumento dos gastos de custeio ocorridos durante o governo Lula significou “aumento da transferência de renda” para as parcelas mais necessitadas da população e denunciou que, agora, ”é neste ponto que estão querendo mexer”. Artur salientou que “a agenda do mercado”, que identificou como a pauta dos derrotados nas últimas eleições, não interessa ao povo brasileiro.

O líder cutista alertou que “este namoro da Dilma com a mídia vai durar seis meses e aí depois o governo virá nos procurar para sustentá-lo, como fez em 2005”. Na época, a mobilização da CMS impediu a materialização do golpe contra o presidente Lula, tramado por demos e tucanos em sintonia com os barões da mídia sob o mantra do “combate à corrupção”.

Para Artur, o fundamental neste momento é construir uma “agenda prioritária” dos movimentos sociais para ampliar a pressão, “com diálogo e luta, negociação e mobilização” e garantir um espaço de interlocução com o governo federal. “Assim como os empresários têm interlocução direta, nós também precisamos ter. E não é reuniãozinha, mas um espaço institucional que envolva os ministérios e as autoridades afins para debater e resolver os nossos problemas, que são os do povo brasileiro”, assinalou.

E, saudando o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, Artur encerrou a intervenção com uma citação histórica da revolucionária Rosa Luxemburgo publicada no jornal do MST: “Há todo um velho mundo ainda por destruir e todo um novo mundo a construir. É preciso auto-disciplina interior, maturidade intelectual, seriedade moral, senso de dignidade e de responsabilidade, todo um renascimento interior do trabalhador. Com homens preguiçosos, levianos, egoístas, irrefletidos e indiferentes não se pode realizar o socialismo”.

Segundo Rosane Bertotti, secretária nacional de Comunicação da CUT e da direção operativa da CMS, “o mais importante é a existência de uma compreensão comum de que devemos estar unidos e mobilizados, movimento sindical e social, para avançar nas conquistas e barrar qualquer retrocesso”.

“Ficou evidente em cada fala, nas contribuições dos diferentes estados e entidades, que vamos à luta contra o corte de recursos, a suspensão de concursos públicos, a elevação dos juros e o freio à expansão salarial, anunciados recentemente pela equipe econômica. Nosso compromisso é com a melhoria das condições de vida e trabalho dos brasileiros e brasileiras e isso se faz com um Estado indutor, que exerça forte protagonismo no combate às injustiças sociais e regionais que ainda nos infelicitam”, sublinhou.

Rosane citou a recente participação em Dacar, no Fórum Social Mundial, para lembrar do enorme reconhecimento internacional ao papel do governo Lula, que é referência por ter defendido o mercado interno, expandido o salário e o emprego, contrariando a lógica do “ajuste fiscal” propagandeada pelo FMI e pelo Banco Mundial.

Em nome da coordenação do MST, Gilmar Mauro defendeu a democratização da comunicação como um elemento chave para o avanço da democracia no país, e alertou para os riscos do governo evitar mexer “nesse monopólio que criminaliza os movimentos sociais e a pobreza”. O caso Cutrale, onde o MST realizou uma ocupação no interior paulista para denunciar a grilagem de terras públicas – que o próprio INCRA confirmou pertencerem à União – é esclarecedor, citou.

Na época, a mídia privada – mais privada do que mídia – divulgou que os prejuízos causados pelo MST totalizaram R$ 1,2 milhão, referentes aos equipamentos danificados, aos defensivos agrícolas extraviados e à parte da lavoura de laranja derrubada. Embora a Justiça tenha desmentido a calúnia e dado ganho de causa ao MST, declarou Gilmar, “durante um tempo não podíamos sair na rua em Bauru, pois produziu-se um consenso para gerar processos coercitivos”.

Na prática, explicou, esta política de “coerção e consenso” fabricada pelos meios de comunicação a serviço do opressor tenta tornar palatáveis para as amplas maiorias as mais repugnantes formas de violência contra o oprimido. Assim, condenou, nos deixam sem opção, “nos perguntam com que molho queremos ser servidos”. Citando a fala de Artur Henrique, Gilmar disse que é preciso apresentar uma pauta unificada com os seguintes pontos, “não necessariamente nesta ordem”, brincou: reforma agrária, reforma urbana, reforma educacional, reforma política, democratização da comunicação, combate à criminalização do movimento sindical e da pobreza, defesa do pré-sal para o povo brasileiro, redução da jornada para 40 horas semanais e defesa das lutas sociais, como o passe livre para os estudantes e o combate à violência contra as mulheres.

Balde de água fria

O presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Augusto Chagas, denunciou que as medidas que vêm sendo adotadas pela equipe econômica estão na contramão do projeto pelo qual a presidenta Dilma foi eleita e representam “um balde de água fria sobre o aquecimento da possibilidade de desenvolvimento brasileiro”.

“Salário mínimo de R$ 545,00, juros altos, corte assustador de R$ 50 bilhões, congelamento de contratações... E a justificativa para isso é um discurso mentiroso, como é o tal surto inflacionário, os gastos públicos”, protestou Chagas, esclarecendo que a real sangria está nas centenas de bilhões que saem dos cofres públicos para o pagamento de juros aos banqueiros, “uma distribuição de renda às avessas".

Sônia Coelho, da Marcha Mundial de Mulheres, destacou que o aumento irrisório dado ao salário mínimo é preocupante, pois mais do que o “valor”, encerra uma concepção que atenta contra o processo de valorização progressiva de um poderoso instrumento de justiça social. Segundo Soninha, o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) apresentou um estudo em 2007 que comprova um levantamento que o movimento feminista havia realizado anos antes: “a valorização do salário mínimo é uma política fundamental para alterar a condição de vida das mulheres e da população negra”.

Na avaliação do vice-presidente da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB), Ubiraci Dantas de Oliveira, o argumento falacioso da “pressão inflacionária”, utilizado para frear a política de valorização do salário mínimo, deve ser combatido “uma vez que a inflação é externa e vem da especulação das commodities promovidas pelas multinacionais”.

Portanto, assinalou Bira, “aumento de juros, arrocho salarial e redução do investimento público, além de serem completamente ineficazes para enfrentar o problema, só tornam o país mais vulnerável”. “Nesta luta pela independência e a soberania nacional nós vamos mobilizar todos os patriotas e enquadrar o Palocci e o Mantega, que estão fazendo o jogo do atraso”, acrescentou.

Representando a Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Rogério Nunes, declarou que o projeto que elegemos era de continuidade do governo Lula, para aprofundar as mudanças. Mas “ao contrário”, denunciou, o valor de R$ 545 aprovado para o salário mínimo reflete uma concepção retrógrada, desmerecendo uma política de valorização que ajudou a combater os efeitos da crise internacional. A decisão da equipe econômica, condenou Rogério, “é monetarista, retrai o crescimento e o desenvolvimento nacional”.

Para o veterano Gegê, da Central dos Movimentos Populares (CMP), é inadmissível que num governo eleito para fazer mudanças, a equipe econômica se coloque na posição de administradora da crise do capital, tentando jogá-la sobre os ombros dos trabalhadores. “É um comportamento oportunista, eleitoreiro, de gente que pega carona no nosso caminhar. Precisamos enfrentar esta concepção, pois é um peso de tora, difícil de carregar”, frisou.

Pressão sobre o governo e o parlamento

De acordo com o secretário de Políticas Sociais da CUT, Expedito Solaney, a unidade de ação e mobilização da CMS será imprescindível para colocar a pressão das ruas dentro do governo e também do parlamento. Solaney citou especificamente a necessidade da aprovação da PEC 438, que expropria as terras onde for encontrado trabalho escravo. “A Lei Áurea teve dez dias de debate no parlamento, a PEC 438 já tem 10 anos. Precisamos garantir a sua aprovação para que estas pessoas que foram escravizadas passem a ser donas da terra”, defendeu.

Para Lúcia Stumpf, da União Brasileira de Mulheres (UBM), a plenária nacional mostra que os movimentos sociais "estão mais vigorosos do que nunca, no Brasil e no mundo, demonstrando que têm força para mudar a corrente do vento". As propostas apresentadas no Projeto Brasil, aprovado em 31 de maio de 2010 pela CMS, enfatizou, devem ser o foco das reivindicações por "reformas que mudem a estrutura do Estado, democratizando-o na essência".

Em nome do Coletivo Intervozes, João Brant denunciou o emaranhado de interesses escusos que se articulam em torno da mídia hegemônica, sublinhando o papel protagônico dos movimentos sociais para que as deliberações da Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) não virem letra morta. A fim de que o novo marco regulatório do setor expresse o desejo e as expectativas da sociedade brasileira, destacou, o momento é de colocar pressão.

A plenária também reafirmou a posição da Assembleia dos Movimentos Sociais, aprovada no Fórum Social Mundial de Dacar, de fazer do 20 de março um Dia Mundial de Luta Contra as Bases Militares dos Estados Unidos e em solidariedade ao povo cubano e palestino, aproveitando a visita do presidente Barack Obama ao Brasil.

Entre outras lideranças, fizeram uso da palavra Edson França, da União de Negros pela Igualdade (Unegro); Yann Evanovick, da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes) e Bartíria Costa, da Confederação Nacional das Associações de Moradores (Conam).