segunda-feira, 28 de novembro de 2011

A educação, o céu e o inferno

Artigo publicado na coluna do jornalista Eduardo Costa

Nesta semana, vivi de perto dois momentos que mostram ângulos absolutamente contrastantes em relação à realidade e, principalmente, ao futuro do aprendizado no país.

Em São João do Manhuaçu, modesta cidade de dez mil habitantes no Vale do Rio Doce, resultados surpreendentes de um esforço conjunto de agentes políticos, professores, alunos e pais dentro de um projeto da Conspiração Mineira pela Educação – movimento que reúne pessoas bem sucedidas e dispostas a ajudar.

Lá, o crescimento de meninos e meninas é visível, emocionante e pode ser comprovado pelos números do IDEB – Índice de Desenvolvimento do Ensino Básico do Ministério da Educação que já ultrapassaram a média nacional e poderão alcançar ainda esse ano a meta do governo federal para 2015. Amanhã, você vai conferir essa revolução do bem nas páginas do Hoje em Dia.

Mas, como a vida não é feita só de flores, também nesta semana eu vi de perto o quanto o poder oprime, manipula, silencia, compra, humilha, massacra. Não discuto detalhes do projeto apresentado pelo governo porque ali estão minúcias que só os técnicos ousam interpretar.

No entanto, apenas um exemplo, dado pelo próprio governo, permite-me afirmar a completa falta de compromisso do Estado para com o futuro da educação. Diz o governo que uma professora, hoje com 27 anos de efetivo exercício em sala de aula, vai ganhar, em 2015, pouco mais de R$ 2.100,00. Ora, então, daqui a quatro anos, quando contar mais de 31 anos de profissão, uma professora vai ganhar menos do que se paga hoje a um agente de polícia recém concursado.

Não é que este ganha muito, ao contrário; o problema é que não dá para defender ou sequer aceitar essa remuneração para quem cuida do futuro do país. Isso sem falar que as lideranças dos professores foram enganadas para por fim aos 112 dias de greve, a comissão prometida nunca decidiu nada, a Assembléia mais uma vez se comportou como casa de ratificação do que quer o Palácio da Liberdade e nós, jornalistas, não gritamos a plenos pulmões a pergunta que não deixará nossa consciência em paz nas festas de fim de ano: será que existirá professor na sala de aula quando nossos netos vierem?

Ah, outra pergunta: será que, com o comportamento submisso e indecente de câmaras municipais, assembléias legislativas e congresso nacional, de trocar verbas e reeleição pelo que quer o dono da caneta, o chefe do executivo, a gente tem Democracia de verdade?

Folha desmonta marketing de Aécio na Folha


Começo a achar que o senador Aécio Neves não fez um bom negócio ao aceitar o convite para escrever às segundas-feiras na página 2 da Folha de S.Paulo. Por um lado, trata-se de um espaço nobre, de grande visibilidade, uma chance para Aécio se fazer ouvir em todo o país. Mas pode também se tornar uma armadilha.

No dia 5 de setembro, no artigo intitulado Inovação, Aécio escreveu:

“Um Steve Jobs não brota por geração espontânea. Ele floresce num caldo de cultura em que a educação é valorizada e o talento, reconhecido.”

“O mundo se dividirá cada vez mais entre os países que investem com seriedade em educação, pesquisa e tecnologia e os que não o fazem.”

Hoje, a mesma Folha traz a seguinte manchete: 17 Estados descumprem lei salarial de professor. Dentro do jornal, a matéria leva o título Minas, Bahia, Pará e Rio Grande do Sul estão totalmente fora de normas.

A Folha informa que, em Minas, Estado governado por Aécio por quase oito anos (2003-2010) e onde ele ainda dá as cartas, o piso salarial dos professores da rede estadual equivale a vergonhosos R$ 616, praticamente a metade do que manda a lei (R$ 1.187 por 40 horas semanais).

O piso salarial de Minas é o mais baixo do país, mesmo comparado com Estados bem menos aquinhoados, como Amazonas (R$ 1.338), Amapá (R$ 2.171), Acre (R$ 1.187), Sergipe (R$ 1.187) e Alagoas (R$ 1.187).

O marketing de Aécio na Folha foi desmontado pela própria Folha.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

O Deus autoritário


A construção de um Estado democrático e o conceito de democracia estão presentes na humanidade desde a formação da confederação de Delos em 477 a.C., quando a Grécia se transformou, pouco a pouco, em notável império militar e democrático. É importante lembrar que conceitos filosóficos e ideológicos, classes sociais, hegemonias circunstanciais, materiais e militares determinam a forma, o conceito e o modelo de Estado e de democracia que se estabelece nas sociedades em cada tempo histórico, desde sua fundação em Atenas.

Passados dois mil e quinhentos anos desde as primeiras iniciativas de constituir Estados democráticos e sociedades democráticas, é que a humanidade se depara com os limites impostos às nações, populações e povos de todo mundo pelos impérios dominantes. Hoje, no contexto histórico em que vivemos, é o setor financeiro como base nas principais economias que impõe seus objetivos até mesmo sobre os direitos políticos da democracia burguesa. Em pleno século XXI, a humanidade vive sob a hegemonia neoliberal, mais especificamente sob a ditadura dos mercados financeiros, desregulados e descentralizados.

Sócrates, um dos maiores pensadores da humanidade foi condenado a ingerir cicuta por um tribunal popular em 399 a.C. por defender a radicalização da democracia. O filósofo morreu acusado por não reconhecer os deuses do Estado, introduzir novas divindades e de corromper a juventude. Sócrates, que dizia: apenas saber que nada sabia; questionava os valores morais e religiosos que orientavam a conduta dos indivíduos e que serviam de base às instituições políticas do seu tempo. Do mesmo modo que gregos de hoje questionam os valores do deus mercado e as suas instituições financeiras internas e externas, que os submetem a um duríssimo ajuste econômico que representará a miséria e a desesperança de milhares de homens e mulheres da velha Grécia, descendentes de Sócrates e Platão.

Ocorre que a tragédia grega não se limita às atrocidades financeiras, aos cortes sociais, ao desemprego, ao aprofundamento da miséria, a destruição de um Estado, berço da civilização ocidental. Hoje, assim como há dois mil e quinhentos anos, a principal vítima na Grécia é a democracia, mesmo limitada e inconclusa, mas referência incontestável do sistema capitalista contemporâneo. Sócrates foi condenado à morte por questionar os deuses do Estado. Chamava seus discípulos à razão, ao questionamento das normas de conduta política. A virtude para Sócrates é o conhecimento absoluto.“O Homem é a medida de todas as coisas”.

Se os deuses do Estado levaram Sócrates à morte, agora é o Deus mercado que leva à morte a democracia, o emprego, a soberania, o futuro da nação grega. O Deus mercado decretou o fim do Governo Papandreou, de tendência social democrata, pois o mesmo diante da falência do Estado, da pressão da Comunidade Europeia, da prepotência do Banco Central Europeu, do FMI - Fundo Monetário Internacional, dos famintos credores internos e externos, resolveu consultar o povo grego por via de um plebiscito. O primeiro Ministro grego, emparedado pela banca mundial, propôs consultar a população e dividir com os gregos a crise do país para escolher o melhor caminho a seguir, diante da grave situação. A resposta foi fulminante em menos de quarenta e oito horas estava deposto o gabinete do governo grego. A banca internacional decretou: não cabe ao povo decidir, não cabe aos eleitores e aos governos estabelecer qualquer mediação democrática, quando o que está em jogo são os interesses do poderoso sistema financeiro global.

A ação política de pena máxima à democracia e ao Estado de direito grego foi mais letal que a cicuta aplicada a Sócrates pelo tribunal de Atenas. O mercado afastou em tempo recorde o primeiro-ministro grego Papandreou. Indicou como substituto um novo representante, banqueiro do FMI, íntimo do mercado financeiro: o primeiro ministro Papademos. A missão foi imediatamente cumprida, mudou o governo, aprovou o projeto financeiro imposto pela banca internacional “demônios” do capitalismo na atualidade.

O nome Papademos não poderia ser tão oportuno, ou seja, se o sujeito papa o demo, o que não fará aos trabalhadores. Conforme os articulistas da grande mídia rentista nacional e internacional, o novo governo Grego é um governo técnico. Em resumo, a democracia, desde os tempos de Sócrates, serve somente quando os interesses do poder constituído não estão em cheque, pois do contrário rasga todos os princípios e códigos que norteiam a famigerada democracia burguesa. Nos tempos atuais, a economia rentista domina a política, fixando e impondo a sua agenda. Marx, em artigo publicado em abril de 1853 dizia: “o mínimo que se pode dizer de um governo técnico é que ele representa a impotência do poder político em um momento de transição.

O mundo está diante de um dilema: construir uma nova alternativa política, econômica e social para a humanidade ou sucumbir diante de um Deus autoritário, covarde e sedento de crises e miséria. O que fica evidente nesta crise europeia, que ainda muito teremos que avaliar é que inevitavelmente morreu a democracia capitalista liberal. Não somente na Grécia, mas também na Itália. A resposta em todo o mundo tem sido ainda inconsistente, mas os movimentos embrionários nos Estados Unidos, Europa, Norte da África e no Oriente poderão assumir novas dimensões. É hora de ampliar a luta anticapitalista e propor novos rumos para a humanidade. Viva a democracia proletária, viva Karl Marx.


Gilson Reis é professor, especialista em Economia do Trabalho pela Unicamp.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Jornalistas buscam apoio de parlamentares
para aprovação das PECs do Diploma

Matéria publicada no site do Sindicato dos Jornalistas de Minas Gerais: www.jornalistasdeminas.com.br

Café Parlamentar rende apoio e propostas de ação pela aprovação das PECs do Diploma

O Sindicato dos Jornalistas conquistou o apoio de deputados federais e estaduais, vereadores, do movimento sindical e das universidades para a Campanha do Diploma no Café Parlamentar realizado na manhã do dia 7 de novembro, na sede do SJPMG. Dezenas de pessoas - ex-presidentes da entidade, estudantes, professores e coordenadores de cursos de comunicação da UNA, da PUC-Minas, Uni-BH e Fumec participaram do evento.

Durante o debate, foram apresentadas propostas para mobilizar a sociedade e sensibilizar deputados federais e senadores a aprovar as PECs 386/09 e 33/09, que tramitam na Câmara e Senado, respectivamente, e preveem a restituição da obrigatoriedade da formação em nível superior específica para o exercício da profissão de jornalista.

Compareceram os deputados federais Jô Moraes (PCdoB) e Fábio Ramalho (PV); os deputados estaduais Luiza Ferreira (PPS) e Fred Costa (PHS); além dos vereadores Arnaldo Godoy (PT) e Carlúcio Gonçalves (PR). Enviaram representantes ou mensagens de apoio Jairo Lessa, Tarcísio Caixeta, Júlio Delgado, Eros Biondini, André Quintão, Elaine Matozinhos, Saraiva Felipe, Aelton Freitas, Dalmo Ribeiro, Paulo Lamac e Eduardo Azeredo, entre outros.

Senadores

O coordenador do debate do Café Parlamentar, o diretor de Relações Institucionais do Sindicato, ex-presidente da entidade e da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Luis Carlos de Assis Bernardes, revelou que os senadores Aécio Neves (PSDB), Clésio Andrade (PR) e Zezé Perrella (PDT) se manifestaram a favor da aprovação da PEC 33/09. “Quando estivemos, eu e a Vera Godoy (diretora de Imagem e Direito Autoral do SJPMG), em Brasília, conversamos com os senadores e eles, pessoalmente ou por intermédio de assessores, se comprometeram em votar favoravelmente à exigência da obrigatoriedade do diploma”, disse Bernardes.

Segundo o deputado federal Fábio Ramalho (PV), o ambiente no Congresso Nacional é totalmente favorável à aprovação das PECs. “Tenho conversado com os deputados e senadores e noto que a maioria, como eu, é a favor do diploma. Para mim, para exercer a profissão, tem que ser diplomado. E temos que lutar para aprimorar ainda mais os cursos. Podem contar comigo, com minha articulação. Eu sempre reúno deputados e senadores na minha casa e posso ajudar a buscar votos para as PECs.”

Para a deputada federal Jô Moraes (PCdoB), o diploma é instrumento de independência do profissional. “A comunicação é um assunto estratégico. O país pode ser dominado por quem domina os meios de comunicação. Os meios de comunicação precisam ser regulamentos para que os órgãos de imprensa exerçam o direito de falar e o povo o direito de se informar e o diploma tem papel preponderante neste cenário”, avaliou.

O vereador Arnaldo Godoy recomendou o máximo de divulgação possível e mais encontros como o desta segunda-feira. “É preciso divulgar ao máximo, usar todas as redes sociais para mostrar à sociedade quem está apoiando a Campanha do Diploma, como os três senadores mineiros”, afirmou. Godoy cobrou maior comprometimento das escolas de jornalismo. “As universidades têm que se envolver mais, têm que se empenhar mais na empreitada, que é dos estudantes.”

Movimento Sindical

O presidente do Sindicato dos Professores de Minas Gerais (Sinpro-Minas), Gilson Reis, propôs uma campanha direcionada à questão do diploma feita em conjunto pela sua entidade, SJPMG, movimento estudantil e coordenadores de cursos de jornalismo. “Precisamos envolver todos numa campanha maciça e levar para as ruas a causa do diploma. A participação das universidades nesta campanha é fundamental para que o debate seja levado á sociedade e que a opinião pública influencie no voto dos deputados”, disse Gilson Reis, que vai agendar uma reunião ainda nesta semana com todos os setores para articular a campanha.

De acordo com Jô Moraes, a Campanha do Diploma pode ganhar maior repercussão no Congresso com a elaboração de um manifesto, assinado pelos deputados e senadores. “O manifesto traria maior visibilidade para a causa, pois seria amplamente divulgado nas mídias do Congresso e nos meios de comunicação.”

Ações políticas

O deputado estadual Fred Costa se comprometeu a coletar assinaturas na Assembleia Legislativa para criar uma Frente Parlamentar em Defesa do Diploma. “É uma forma de criar um fato político”, disse. Fred Costa colocou seu mailing com mais de 400 mil e-mails para massificar a campanha pela volta do diploma. “O engajamento da sociedade é imprescindível e, para isso, precisamos divulgar ao máximo a campanha e buscar o apoio da população. Assim, vamos pressionar o Congresso a aprovar as PECs.”

Luiza Ferreira lembrou que, quando presidiu a Câmara Municipal, trabalhou pela aprovação de projeto do vereador Adriano Ventura (PT) que obriga o Legislativo e o Executivo municipais a contratar apenas jornalistas formados. “O projeto foi aprovado e sancionado. Belo Horizonte foi uma das cidades pioneiras no assunto”, disse a deputada estadual. “Eu me comprometo a repercutir o debate de hoje na tribuna da Assembleia Legislativa.” Luiza Ferreira disse que vai buscar informações do projeto do deputado Alencar da Silveira que propõe que os órgãos do Estado também só contratem jornalistas diplomados.

Para os parlamentares presentes no evento, a Campanha do Diploma vai depender não apenas do esforço dos jornalistas, mas de uma ação articulada no Congresso Nacional. “A campanha precisa ser assumida por um grupo, um bloco dentro do Congresso, que vai montar uma estratégia no dia de votação. É necessário trabalhar nas comissões e um grupo pode desenvolver este trabalho”, afirmou Ronan Ramos, representante do deputado Eduardo Azeredo (PSDB).

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Banco Central: autonomia de quem, cara pálida?




Desde o início do ciclo neoliberal no Brasil, setores vinculados aos poderosos interesses financeiros e ao próprio sistema financeiro nacional e internacional tencionam os sucessivos governos para estabelecer, de forma definitiva, através de reforma constitucional, a plena autonomia do Banco Central do Brasil. Dizem os especialistas de plantão, senhores muito bem renumerados pelo mercado, que a política monetária vinculada aos interesses do Estado é o caminho mais curto para se chegar às crises econômicas que solaparam o desenvolvimento do país no período anterior aos anos noventa.

Os rentistas de plantão internos e externos exigiram do Presidente Lula, mesmo antes das eleições de 2002, que o levou ao posto máximo da república, a se comprometer com uma política macroeconômica amplamente desfavorável ao país, a famigerada carta aos brasileiros. A exigência do mercado tinha como um dos pilares justamente a manutenção da política monetária praticada ao longo do governo Fernando Henrique. A receita do mercado consistia, basicamente, na utilização de juros elevadíssimos, um dos maiores do mundo, como forma de atrair capitais internos e externos para financiar a economia nacional. Contudo, a remuneração dos papeis da dívida pública brasileira, transacionados nos últimos anos, elevou a dívida interna dos seus 68 bilhões de reais no início do governo FHC para um trilhão e quinhentos bilhões no final do governo Lula.

Conforme o economista Márcio Pochmann, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA, apenas vinte mil famílias brasileiras têm em poder parte desses papéis, o restante, é claro, está em mãos dos grandes grupos financeiros espalhados pelo mundo afora. É importante frisar que a política monetária em vigor, além de proporcionar um aumento estratosférico da dívida pública interna, tem efeitos colaterais extremamente negativos para o dia a dia da população.

Primeiro porque impõem que 20% da carga tributária seja deslocada para rolagem da dívida interna em detrimento da saúde, educação, segurança; segundo porque o aumento dos juros restringe o crédito para a economia real, reduzindo a capacidade de crescimento da economia, o que implica em menos emprego, menos salários e menos desenvolvimento; terceiro porque utiliza da política monetária para controle da inflação, impondo ao conjunto da população metas inflacionárias que em muitos momentos favorecem mais o capital especulativo que a economia real.

É importante lembrar que o mesmo Deus-mercado que exige a autonomia do Banco Central em relação ao governo, é o mesmo mercado que exigiu a completa desregulamentação do mercado de derivativos, que levou as principais economias do planeta a mais profunda crise estrutural do sistema capitalista, desde os anos trinta do século passado. Analistas de mercado afirmam que Estados Unidos e Europa já torraram vinte e cinco trilhões de dólares com o objetivo de controlar a crise. Estão previstos ainda dezenas de trilhões de dólares para recolocar a economia das principais potências no eixo do crescimento novamente.

O debate em torno da política monetária ganhou maior dimensão há mais ou menos cinquenta dias. Naquela ocasião, o Banco Central, analisando a crise externa, seus impactos na economia brasileira, a desaceleração do crescimento interno, a desindustrialização de setores da economia, os juros exorbitantes praticados desde o início do governo Dilma, resolveu, de forma soberana, reduzir os juros da taxa Selic em 0,5%. A gritaria foi ensurdecedora. O mercado que fica com um olho no gato e outro no rato, ou seja, com um olho nos rendimentos dos papéis e no quanto a inflação come esta rentabilidade, decretou solenemente o fim da autonomia do Banco Central e conforme seus agentes e articulistas a intervenção “desastrada” da Presidenta Dilma na política monetária.

Passados cinquenta dias e mais um recuo de 0,5% na taxa Selic, que dessa vez foi previamente absorvido pelo mercado, ficou demonstrada a justeza da posição do Presidente do Banco Central e da Presidenta Dilma. Agora, passada a primeira batalha, é preciso o governo brasileiro definir de forma definitiva quem controla o Banco Central: ou o governo eleito por milhões de brasileiros ou o mercado que não teve um único voto e se arvora em controlar o Banco Central e a política monetária do país. Passou da hora, depois de quase duas décadas de Banco Central controlado e presidido por agentes do mercado financeiro interno e externo, em dar seu grito de liberdade e autonomia. Seu grito de independência ou morte.

Nesse cenário de crise internacional, com perspectiva de diminuição do crescimento global, com restrição das exportações, com desconfiança generalizada entre países e povos é que o governo brasileiro deve mudar de forma profunda a política macroeconômica. O primeiro passo é dizer ao povo brasileiro que, a partir de agora, o Banco Central do Brasil terá ampla autonomia e independência em relação ao mercado financeiro interno e externo e seus especuladores; que as políticas monetária, cambial e fiscal são de responsabilidade do governo federal, da Presidenta Dilma e de seus ministros. Enfim, que os interesses do mercado serão colocados em segundo plano.

Nesse cenário de muitas dificuldades externas e internas é preciso que o governo diga ao povo brasileiro que necessitamos de mais desenvolvimento, mais saúde, mais educação, mais emprego, mais renda para quem trabalha e produz. É hora de mostrar ao povo brasileiro e ao mundo, para além dos discursos, que os maiores responsáveis pela crise internacional que abateu milhões de trabalhadores pelo mundo afora tem um responsável: o mercado financeiro autônomo, independente e irresponsável. Deu no que deu, é hora de mudar.


Gilson Reis é professor, especialista em Economia do Trabalho pela Unicamp.